terça-feira, 29 de abril de 2014

Ações disciplinares?

Casamento de sacerdote gay gera debate na Igreja Anglicana

 
Patricia Tubella
Em Londres (Reino Unido)

Os primeiros casamentos na Inglaterra e no País de Gales entre pessoas do mesmo sexo começaram a ser realizados assim que passou a vigorar a lei que permite o casamento gay. Acima, Nikki Pettit (esq.) eTanya Ward se casam em Brighton / Neon Leal/AFP
 
O sacerdote protestante Jeremy Pemberton se casou no último sábado (12) com seu parceiro, abrindo um precedente que agora o ameaça com ações disciplinares por parte da Igreja da Inglaterra. Escolheu para o enlace o cenário de um hotel, em vez de sua própria paróquia, porque o anglicanismo conseguiu ficar isento de oficiar os casamentos gays amparados pela lei que entrou em vigor no Reino Unido no mês passado. O padre instigou com seu gesto de rebeldia um debate que divide os fiéis e a própria hierarquia da igreja, entre os que querem adaptar-se à sociedade dos novos tempos e os que temem uma fuga do setor mais imobilista, encarnado principalmente nos fiéis de terras latino-americanas e sobretudo africanas.

O arcebispo de Canterbury e chefe religioso da comunidade anglicana no mundo, Justin Welby, sugeriu na semana passada que os fiéis dos países africanos se arriscavam ao assassinato se sua igreja aceitasse o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Sem citar expressamente a perseguição de que são alvo os homossexuais em muitos países do continente, e com especial empenho em Uganda, Welby salientou que "a introdução dos casamentos do mesmo sexo como nova realidade em nosso país terá consequências na vida e na disciplina de nossa igreja".

Essa resistência da maior religião do Reino Unido levou o primeiro-ministro britânico conservador, David Cameron, a excluir de forma expressa da legislação que ele mesmo promoveu no Parlamento no ano passado o ofício dos casamentos gays nas sedes anglicanas, que ficaram limitados a cerimônias em prefeituras ou em outras igrejas mais liberais. A Igreja Anglicana constatou em março passado, devido aos primeiros casamentos legais de parceiros homossexuais, que "a lei mudou e aceitamos a situação", sugerindo que não faria campanha expressa contra essa mudança.

Outra coisa é que, menos de um mês depois da implementação da lei do casamento gay, um religioso da diocese de Lincoln, Jeremy Pemberton, optasse por usufruir da mesma no último fim de semana, violando de forma expressa a tradicional premissa de sua igreja de que o casamento só é concebível como "a união entre um homem e uma mulher". Divorciado e pai de cinco filhos, o sacerdote rebelde inclusive escreveu um tuíte para relatar o "casamento extraordinário". Um verdadeiro desafio que aprofunda o debate na Igreja da Inglaterra, diante das reclamações para que reconheça a liberdade da opção sexual e também o bispado das mulheres, opção derrotada em seu último sínodo, apesar de contar com o apoio do moderado Welby. O ramo eclesial de Gales se adiantou, aprovando por maioria arrasadora a futura proclamação de uma bispa, que se prevê iminente apesar das reticências de tantos sacerdotes a submeter-se às orientações de uma mulher.

Que a Igreja da Inglaterra não pode permanecer estática se quiser garantir sua sobrevivência é a mensagem de um padre que provavelmente sofrerá represálias por protagonizar um casamento com seu parceiro apesar de sua igreja o ter vetado expressamente. Essa é a realidade que enfrenta dia a dia uma religião no mínimo dividida em duas, mas que, à diferença de outras religiões mais apegadas à ortodoxia, continua debatendo abertamente seu papel em um mundo no qual tenta continuar sendo relevante.

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves 
 
Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=8283866662245015138#editor/target=post;postID=5768855391290753101